JB Xavier

Uma viagem ao mundo mágico das artes!  A journey into the magical world of  the arts!

Textos

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UMA LIÇÃO DE VIDA!
J.B.Xavier


Cansado de mais um dia de trabalho, quando cheguei em casa já passava das dez horas da noite. Mal pisei em casa, minha esposa veio ao meu encontro, e após um beijo rápido, disse-me:
— Precisamos fazer alguma coisa com Claudinho. Ele está impossível! Venha ver o que ele fez desta vez! Ele está de castigo em seu quarto a tarde inteira! Imagine, colocou uma cadeira sobre uma mesa e subiu nela...claro que caiu e quase quebrou uma perna......
Eu havia tido um dia puxado, e minha cabeça ainda doía, de maneira que a última coisa que eu desejava agora era um blá blá bla´ a respeito das peraltices do Claudinho. Nervoso como eu andava ultimamente, essa buzina em meus ouvidos bem poderia ser o estopim para outra das discussões que vinham pouco a pouco, minando meu casamento.
— Calma! – repliquei já alterando a voz – deixe-me chegar primeiro, ora bolas! Eu prometi a ele que iríamos ver o último desenho da Disney no shopping. Mas, de novo falhei com minha palavra. Vou lá no quarto dele me desculpar, e lhe dizer que amanhã iremos ao cinema. Depois você me conta o que aconteceu!
— Não o tire do quarto! — sibilou minha esposa irritada, enquanto eu subia as escadas — ele está de castigo e precisa aprender uma lição!
A voz ameaçadora e cheia de raiva chicoteou-me os ouvidos enquanto minhas têmporas latejavam. Era por recepções como esta que, a cada dia, eu tinha menos vontade de voltar para casa. O que me prendia, ainda era o Claudinho, meu filhinho de nove anos, uma dádiva dos céus que eu amava mais que tudo na vida.
A cada dia, sua mãe me contava sobre as peraltices, e a cada dia tínhamos menos paciência com ele. Um amigo de infância, que se hospedara certa vez em minha casa, já havia me prevenido: “cuidado para não perder seu filho” – dissera ele – “essa é uma idade crítica em que ele precisa muito de seu tempo”.
Eu já havia pensado muito sobre essa advertência, mas o que eu poderia fazer? Meu trabalho me absorvia cada vez mais, principalmente agora que as coisas estavam dando certo, por isso, confesso, tempo definitivamente era o que eu tinha cada vez menos, não somente para meu filho, mas também para Graça, minha esposa.
Assim, mais nervoso ainda que quando chegara, detive-me diante da porta do quarto e respirei fundo, tentando reunir paciência para não perder o controle com o que me esperava lá dentro.
Quando abri a porta, entretanto, deparei-me com Claudinho debruçado sobre a mesinha onde fazia suas lições de casa, dormindo profundamente sobre algumas folhas de papel, escritas com sua letrinha miúda e ainda feinha, apesar de todas as broncas que eu já lhe dera para que melhorasse a caligrafia.
Tudo o que eu tinha a lhe dizer desapareceu e deu lugar a uma ternura imensa, ao vê-lo ali, em seu mundinho de fantasia, rodeado de ursinhos, carrinhos e super-heróis, num sono só possível às crianças.
Tomei-o cuidadosamente nos braços e levei-o para a cama, onde o deitei e cobri carinhosamente, depositando-lhe um beijo de boa noite nas bochechas rosadas. Amanhã seria sábado, pensei, e após uma passada rápida no escritório, teríamos boa parte do dia para estarmos juntos. Mas, como eu veria mais tarde o amanhã seria muito, muito diferente.
Eu já ia saindo do quarto, quando pousei os olhos nas folhas escritas, sobre a mesinha. Até onde eu sabia ele não gostava de escrever, e sempre que o fazia e vinha me mostrar o que escrevera, eu não perdia a oportunidade de lembra-lo para melhorar a caligrafia.
Desta vez, porém, notei que sua escrita estava ainda pior, como se ele a tivesse escrito às pressas, ou com medo de ser descoberto. Curioso, peguei as folhas e sentei-me na beirada da cama onde pus-me a lê-las. Alguns trechos estavam borrados porque água havia pingado sobre a tinta. Olhei ao redor e não vi nenhum copo d’água. Teria ele chorado enquanto escrevia?
A medida que eu lia, o céu ia descendo sobre minha cabeça, como uma gigantesca prensa, e senti que minha estatura ia diminuindo diante de meu garoto adormecido, até que me senti um habitante de Liliput diante de Gulliver.
Em certa altura do texto pude ler...
”Puxa, fiquei tão feliz quando consegui alcançar aquele livro sozinho! Eu estava ansioso por mostrar a você o que você me ensina. Fiquei na pontinha dos pés. Ainda assim não consegui. A estante era muito alta. Também, o mundo parece ter sido feito só para os adultos! Fiquei muito triste por pensar que não poderia apanhar o livro. Então me lembrei que quando você guarda meus brinquedos em cima do guarda-roupas, você sobe numa cadeira. Ainda bem que Deus é bonzinho e permite que a gente tenha idéias! então eu usei uma cadeira também! Se você usa, é porque funciona! Logo fiquei quase da altura de você. De novo na pontinha dos pés, eu me estiquei todo para alcançar o livro. Eu já estava até imaginando você sorrindo de felicidade por ver como eu consegui tirar seu livro de receitas da estante sozinho. Mas ele ainda estava muito alto! Me estiquei mais um pouquinho. A cadeira tremia toda, e tive que ficar só na pontinha dos dedos dos pés, mas alcancei o livro!Era o meu prêmio! Mas logo que o retirei da estante, vi que era muito pesado para mim. Você nunca me avisou disso! Não agüentei o peso e quando soltei o livro, eu já estava desequilibrado. A cadeira escorregou e eu caí. Droga! por que eu não tenho os braços fortes com os de papai e as pernas firmes como as suas? Papai pega os livros na estante como se fossem penas, e você sobe nas cadeiras e elas não tremem. Mas eu não! E lá estava eu no chão. A cadeira virada e o livro rasgado. E que barulhão eu fiz quando caí! Justo quando eu só queria pegar o livro, quietinho, e levar para você fazer coisas deliciosas para nós.
Então você chegou. Estava tão zangada que pensei que fosse me matar! Eu tentei dizer para você que eu só queria mostrar que já era grande, mas você gritou tanto comigo...você disse coisas tão feias para mim...coisas que você já tinha me proibido de dizer para os outros...você me chamou de burro, de desastrado, e por muito tempo, você ficou sobre mim, gritando desesperada. Droga! mais um fracasso! Eu era mesmo um burro e desajeitado. Você disse isso, e eu sempre acredito em você. Mas, então por que às vezes você me acaricia e diz que me ama muito? eu acho mesmo que você não me ama nada e diz isso só pra me consolar...Como a senhora pode amar um menino tão desajeitado e burro? No outro dia foi o copo que quebrei. Lembra? Eu não sabia que ele estava ensaboado. Nem sabia que sabão era liso! Ah! E tem também aquele brinquedo que desmontei. Você gritou muito comigo naquele dia...Puxa! Eu só queria saber como ele era feito e o que tinha dentro! Acho que ser curioso é muito feio.
Eu não gosto de gritos. Eles me assustam e me fazem ter sonhos maus à noite. Á vezes faço força para não dormir, só para não sonhar coisas ruins...Puxa vida! e eu só quero agradar você e papai! Eu queria que ele tivesse tempo para mim. Eu tenho tanta saudade dele durante o dia! Eu só quero mostrar que eu já sei fazer coisas. O Juquinha, a senhora conhece, não pode andar. Ele vive numa cadeira de rodas. Outro dia, eu estava brincando com ele, e quando fui correndo buscar a bola que ele atirou com seus braços fininhos, vi a mãe dele chorando baixinho sentada na escada onde a bola caiu. Ela falou tão baixinho que quase não ouvi: Ela disse: ‘eu queria tanto que ele fizesse tudo o que você faz!’ A mãe do Juquinha não é feliz. O pai também não. Mas você também não é feliz comigo, porque fazendo o que o Juquinha não pode fazer, eu me torno um desastrado. Imagine, rasguei seu livro de receitas! O Zezinho, sim, tem uma mãe e um pai legal! Outro dia, ele ganhou um carrinho e começou a desmontar. O pai dele disse: ‘Você vai conseguir montar isso outra vez?’ O Zezinho olhou para o pai dele com cara de quem não tinha muita certeza. ‘tá bom’ - disse o pai dele – ‘eu te ensino a desmontar e depois te ensino a montar de novo’. Foi da hora! Descobrimos cada coisa legal dentro do carrinho!
Daqui a pouco o papai chega. Eu sei que vou me assustar de novo com os gritos dele quando você contar a ele que eu caí da cadeira. Hoje à noite vou ter sonhos ruins. Sabe, eu amo muito você e o papai, mas queria tanto ser irmão do Juquinha ou do Zezinho...”
Não sei por quanto tempo fiquei a olhar para o papel, pairando numa espécie de torpor indizível, onde eu podia ouvir as batidas de meu próprio coração como se fossem um tambor soando no infinito de minha alma. Não sei como minha vida desfilou diante de mim em átimos de segundos, como me lembrei de meus medos infantis, das mãos de minha mãe, que seguravam as minhas até que eu adormecesse.
Olhei para meu garotinho dormindo e acariciei seus cabelos. O que estávamos fazendo a ele? Prometi do fundo da minha alma que daquele dia em diante, ele nunca mais teria sonhos ruins. Só voltei a mim quando minha esposa tocou meu ombro.
- Acho que ele aprendeu a lição – cochichou ela – deixe-me cobri-lo melhor...
- Não sei se havia algo a ser aprendido – respondi, enquanto lhe estendia as folhas escritas –mas certamente acabou de me ensinar maior lição de minha vida, a de que a felicidade raramente está ausente, nós é que não notamos sua presença...

Outubro / 1986
Revisado em Agosto de 2001


* * *

A LESSON FOR LIFE!
J. B. Xavier

I was really tired of another day of work, and when I got home it was past ten o'clock at night. As soon as I stepped into the house, my wife came to meet me, and after a quick kiss, told me:

— We need to do something with our boy. It is impossible! Come see what he did this time! He is grounded in his room all afternoon! Imagine, he put a chair on a table and climbed up ... of course he fell and almost broke a leg...

I’d have a hard day, and my head still hurt, so the last thing I’d like to have now was a blah blah blah 'about the cockiness with our son.
Nervous as I was lately, this horn in my ears could be the trigger for another of the discussions that had been gradually eroding my marriage.

— Easy! — I replied already changing the voice - let me come first, what the hell! I promised him we would see the last of the Disney cartoons at the mall. But, again I failed with my word. I'll go in his bedroom to apologize and tell him that tomorrow we’ll go to the movies. Then you tell me what happened!

— Do not take him from the room! — Hissed my wife angry, as I climbed the stairs - he is grounded and must learn a lesson!

The threatening and angry voice whipped my ears while my temples throbbed. It was for receptions such as this, every day, I had less desire to return home. What held me was still our nine years old boy, a gift from heaven that I loved more than anything in life.

Every day, his mother told me about the cockiness, and each day we had less patience with him. A childhood friend, who once stayed at my house, had warned me: "Be careful, or you willlose your child" - he said - "this is a critical age where he needs much of your time."

I had thought much about this warning, but what could I do? My work absorbed me more and more, especially now that things were going well, so I confess, it was definitely time I had less and less, not only for my son, but for my wife too.

Thus, even more nervous than I arrived, I stopped at the door of the room and took a deep breath, trying to gather the patience to not lose control of what awaited me inside.

When I opened the door, however, I saw my little boy lying on the table where he did his homework, asleep on a few sheets of paper written with the fine and still ugly letter, despite all the scolding I had already given to improve the handwriting.

All I had to tell him disappeared and gave way to a great tenderness, when I saw him there in his little world of fantasy, surrounded by teddy bears, toys, cars, and superheroes, only possible in infant sleep.

I took it carefully in my arms and took him to the bed, where I lay down and cover him gently, depositing him a goodnight kiss on the cheeks. Tomorrow would be Saturday, I thought, and after a quick visit in the office, we would have most of the day to be together. But, as I would see later, tomorrow would be very, very different.

I was about to leave the room, when I laid my eyes on the written pages on the table. As far as I knew he didn’t like to write, and whenever he did, come and show me what he had written, I did not miss the opportunity to remind him to improve his handwriting.

This time, however, I noticed that his writing was even worse, as if he had written in haste or in fear of being discovered. Curious, I took the sheets and sat on the edge of the bed where I began to read them. Some passages were blurred because water had dripped on the ink. I looked around and saw no glass of water. Had he been crying while writing?

As I read, the sky was falling on my head, like a giant press, and I felt that my diminished stature before my boy asleep until I felt an inhabitant of Lilliput in front of Gulliver.
At one point I read the text ...

"Wow, I was so happy when I achieved that book alone! I was eager to show you what you teach me. I was on tiptoe. Still could not. The stand was very high. Also, the world seems to have been made only for adults! I was very sad to think that I could not take the book. Then I remembered that when you keep my toys on top of the wardrobe, you climb on a chair. Thankfully, God is nice and allows us to have ideas! Then, I used a chair too! If you use it is because it works! I soon almost as tall as you. Again on tiptoe, I stretched to reach the whole book. I was wondering until you smiling with happiness to see how I could take your cookbook shelf alone. But he was still too high! I stretched a little more. The chair was trembling, and had to be only the tip of the toes, but I obtained the book! It was my prize! But once they pulled it off the shelf, I saw it was too heavy for me. You never told me that! Could not bear the weight and when I released the book, I was unbalanced. The chair slipped and I fell. Damn! why do not I have strong arms like daddy and firm legs as yours? Dad takes the books on the shelf as if they were feathers, and you climb on the chairs and they do not tremble. But I do not! And there I was on the floor. The chair turned and ripped the book. And that loud noise I made when I fell! Just when I just want to get the book, quietly, and take you to do nice things for us.

Then you arrived. You was so angry that I thought you would kill me! I tried to tell you that I just wanted to show that I was great, but you cried so much me... you say such ugly things to me ... things that you had forbidden me to tell you ... You called me a donkey, a clumsy and for long time, you got on me, screaming in despair. Damn! another failure! I was really a stupid and clumsy. You said it, and I always believe in you. But then why sometimes you caress me and say you love me too? I think you do not love me and say that just to console me... How can you love a boy so clumsy and stupid? The other day was the glass that broke. Remember? I did not know he was soapy. Neither knew that soap was flat! Ah It also has one toy that dismantled. You cried so much me that day... And I just wanted to know how it was done and what was inside! I think being curious is very ugly.

I do not like shouting. They scare me and make me having bad dreams at night. Sometimes try hard not to sleep, just to have no dream about bad things... And I just want to please you and Dad! I wish he had time for me. I miss him so much during the day! I just want to show that I already know how to do things. I have got a friend, you are aware, can not walk. He lives in a wheelchair. The other day I was playing with him, and when I ran to get the ball he threw with his skinny arms, I saw his mother crying quietly, sitting on the stairs where the ball landed. She spoke so softly that I almost did not hear: She said, ‘I so wanted him to do everything you do!’ His mother is not happy. His father also did not. But you also not happy with me, because doing what my friend can not do, I become a fumble. Imagine, I tore your cookbook! I have got other friend, that has a mother and a father wonderful. Another day, he got a toy and began to dismantle. His father said: 'You will be able to mount it again?’ My friend looked at his father like somebody who was not sure. 'okay' - said his father - 'I'll teach you to dismount and then teaching you to ride again.’
We found much interesting stuffs in the toy!
Soon Dad arrives. I know I'm going to scare me again with his cries when you tell him that I fell off my chair. Tonight I have bad dreams. You know, I love you and daddy very much, but I wanted to be either the brother of my friends. "

I do not know how long I was looking at the paper, standing in a kind of torpor unspeakable, where I could hear the beating of my own heart as if it were a drum sounding at infinity of my soul.

I do not know how my life passed before me in split second, as I remembered my childhood fears, the hands of my mother, who held mine until I fell asleep.

I looked at my sleeping boy and stroked his hair. What we were doing to him? I promised the bottom of my soul that day on, he never would have bad dreams. Just came to me when my wife touched my shoulder.

— I think he learned a lesson – she whisper — let me cover him better...

— I don’t know if there was anything to teach him — I said, while show her the handwritten sheets - but surely he ended up teaching me the more lesson I learn in my life: The happiness is rarely absent, but we often don’t notice their presence...

* * *
JB Xavier
Enviado por JB Xavier em 22/09/2006
Alterado em 06/11/2014


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